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FOTO.     Sansão recebendo carinho num local seguro: seu lar com o tutor Nathan
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Em busca de justiça

Confins, Minas Gerais, julho de 2020 – No auge da crueldade humana. Ultrapassando barreiras de dignidade e ética. Dois homens e um facão. As patas traseiras de Sansão, o cachorrinho de 2 anos, foram decepadas.

O consultor de vendas Nathan Braga, 21 anos, é o tutor de Sansão. “É muito triste pensar que um animal sem deficiência passou por um trauma muito grande por um humano, uma pessoa racional deixou o cachorro deficiente”, expõe.

Sansão costumava ficar nas dependências da empresa da família, por ser um cão de grande porte é recomendado um

População total*         6.730
Área                    42,008 km² 
*estimativa populacional IBGE/2010

espaço amplo para brincar e se desenvolver, características que o local oferecia a ele.  Em um final de tarde, ele fugiu atrás de outros cachorros que estavam soltos pela rua. Ao sentir sua falta, o irmão e o pai de Nathan saíram à procura e ao passar na frente de uma casa, escutaram latidos e a voz de um homem dizendo “pega o facão, pega o facão”. Sem muros. Fácil acesso. Adentraram pela porta dos fundos, mas o fato já havia sido consumado.

“Na hora que o meu pai chegou, o sujeito já estava segurando o Sansão pela coleira e as palavras dele foram: ‘toma aí o seu cachorro, agora ele não vai vir aqui nunca mais’.”

Os crimes de maus-tratos contra animais cresceram cerca de 15% em 2020 no Estado de Minas Gerais. De janeiro a junho foram registradas 1.083 ocorrências, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública.

A polícia foi acionada imediatamente e ainda no local dos fatos, um dos agressores disse aos militares que Sansão não havia mordido nem ele e nem os outros cães.

Conduzido à delegacia, em seu depoimento relatou outra versão, alegando que agrediu o Sansão por ele ter atacado os seus cães e ficou com medo de acontecer o mesmo com sua mãe, que é cega. O homem e os cães não possuíam lesões que comprovassem tal fato.

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Nathan Braga
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Sansão é da raça pitbull, estipulada pela sociedade como um cão de guarda e atrelada a condutas agressivas. “Ele nunca foi condicionado a ter comportamentos agressores e protetores, muito pelo contrário, sempre o estimulamos a ser dócil e amigável. Nunca ocorreu nenhum acontecido dele avançar nas pessoas, até reclamações de vizinhos nunca tivemos. Para nós ele é considerado um membro da família”, comenta o tutor.

Por fim, registrado o boletim de ocorrência um dos criminosos foi ouvido e liberado. O outro suspeito, seu irmão, teve participação no crime, porém conseguiu fugir do local. “Ele saiu na porta da frente da delegacia como se nada tivesse acontecido, pela lei ‘ok’, o crime é de menor potencial ofensivo”, explica Nathan.

Unindo forças

A atual legislação brasileira que rege a proteção dos direitos animais é branda. “Eu acho que a lei que está em vigor tem que ser mudada totalmente. O indivíduo que fez isso com o Sansão não será preso, ele vai assinar um termo circunstancial e a pena dele será pagar cesta básica. Mas pensa só, um homem torturou um animal, a policial militar que atendeu a ocorrência falou que o corte não foi linear, ou seja, não foram as duas patas de uma vez, ele decepou uma e depois a outra. Totalmente cruel. Então, vai esperar esse cara fazer alguma coisa com uma pessoa ou com outro animal?”, diz Braga.

 

O caso do Sansão mobilizou as redes sociais e a sociedade como um todo. A luta por justiça e punição justa aos responsáveis pela atrocidade com o cão baseia-se na aprovação do Projeto de Lei nº 1.095, de 2019, que foi nomeado por Lei Sansão. A iniciativa é do Deputado Federal Fred Costa e prevê:

Alteração da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para aumentar as penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato.

“Com uma movimentação da sociedade uma mudança pode acontecer, já está acontecendo. Os animais pedem por isso.”

Nathan conta que Sansão está sendo acompanhado por diversos médicos veterinários, fazendo fisioterapia e não corre riscos. “Ele está me dando uma lição de vida muito grande. Os animais não sentem aquele remorso que os humanos sentem. É impressionante a força e a vontade de viver que ele tem, muito guerreiro, o nome dele já diz tudo.”

Brasília, Distrito Federal, 29 de setembro de 2020 – Após quase 3 meses da tragédia, o Projeto de Lei nº 1.095 foi sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro e transformado na Lei nº 14.064, alterando a Lei de Crimes Ambientais e estabelecendo pena de reclusão de 2 a 5 anos e proibição de guarda quando praticado ato de abuso, maus-tratos ou mutilação contra cães e gatos.

“chegará o tempo em que o homem conhecerá o íntimo de um animal e nesse dia todo crime contra um animal será um crime contra a humanidade.”

- Leonardo da Vinci

(1452-1519)

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Nathan Braga e Sansão no Congresso Nacional, em Brasília, no dia da sanção do Projeto de Lei nº 1.095, homenageado por Lei Sansão

O animal é o melhor amigo do homem, mas o homem é o melhor amigo do animal?

Um percurso 360º na legislação brasileira, no que tange aos animais e seus direitos

Animais de todas as espécies merecem certa relevância dentro da sociedade, visto que existiram e estiveram inseridos no meio ambiente antes da existência do homem. Os primeiros a habitarem a Terra. Dado este motivo, é dever do ser humano atentar-se e fornecer bem-estar a eles.

Atualmente, a legislação brasileira é considerada ampla em relação aos animais, são diversas as leis que os protegem, todas com suas especificidades e condições.

O advogado Fabio Akiyooshi Jogo explica que desde os anos 30 há normas que regem os animais, como o Decreto 24.645 de 1934. “Essa própria legislação, super antiga, já tutelava os direitos processuais dos animais, ou seja, eles já poderiam figurar em processos desde aquela época, obviamente representados por membros do Ministério Público ou associações de proteção aos animais.”

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DIREITO ANIMALISTA

Uma linha do tempo com as proteções jurídicas dos animais

1934

Decreto nº 24.645
Primeira legislação que estabelece medidas de proteção aos animais e a caracterização de maus-tratos, do Governo Provisório.
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1988

Art. 225 da Constituição Federal
Trata do meio ambiente e traz a proteção à fauna e a flora pelo Estado e sociedade. Especifica a proibição dos maus-tratos aos animais.

1998

Lei nº 9.605
Lei de Crimes Ambientais
Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Tornou crime maus-tratos aos animais, com pena de 3 meses a 1 ano, e multa.
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Instrução Normativa n° 03
Estabelece, padroniza e moderniza os métodos humanitários de insensibilização dos animais de açougue para o abate, assim como o manejo destes nas instalações dos estabelecimentos aprovados para esta finalidade.

2000

2002

Lei nº 10.519
Fiscalização da defesa sanitária animal para a realização de rodeios. Atendimento veterinário, transporte em veículos apropriados, acessórios que não causem ferimentos e as cordas redutoras de impacto.
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2008

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Instrução Normativa n° 56
Recomendações de bem-estar animal para animais de produção e de interesse econômico.

2016

Lei nº 13.364
Proibição da vaquejada.

2017

Decreto nº 9.013
Disciplina a fiscalização e a inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal. Medidas para evitar maus-tratos aos animais e verificação dos meios utilizados para transporte dos animais em carga viva.
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2018

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2019

Decreto nº 9.975
Elaborado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Avaliação de protocolos de bem-estar animal elaborados por entidades promotoras de rodeios.
Instrução Normativa n° 46
Regulamenta a exportação de bovinos, bubalinos, ovinos e caprinos vivos destinados ao abate, engorda ou reprodução.
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2020

Lei nº 14.064
Altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para aumentar as penas contra o crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato, passando para detenção de 2 a 5 anos.
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Há uma crescente no número de ativistas que lutam em defesa dos direitos dos animais, contra a crueldade e maus-tratos. Uma das grandes questões enfrentadas pela sociedade diz respeito sobre a natureza jurídica dos animais não humanos.

O Código Civil brasileiro considera os animais como objetos de direitos e não sujeitos de direitos, ou seja, são vistos como coisa, conforme dispõe no art. 82. “São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.”

Em 2019, foi aprovado pelo Senado o Projeto de Lei 27/2018, que determina que os animais não humanos possuem natureza jurídica sui generis, vedando o seu tratamento como coisa.

Sui generis, sujeitos de direitos despersonificados.

O PLC segue em tramitação.

“Nós temos um conflito entre Constituição e Código Civil no que tange ao entendimento de qual é a personalidade desse animal, se é um sujeito de direito, se é um objeto, se é um semovente”, esclarece o advogado Fabio Akiyooshi. A interpretação de que os animais não possuem direitos – na legislação brasileira – é generalizada pela população, por conta da divergência de interpretação do que é trazido na Constituição Federal com o Código Civil.

Este contexto vem ganhando cada vez mais espaço e lugar de fala dentro da nossa sociedade. De acordo com o Fabio, vemos o Direito Animal sendo considerado um ramo do Direito a parte do Direito Ambiental, que visa defender os animais independente do meio ambiente que estão inseridos, protegendo-os como indivíduo, de qualquer espécie.

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Conheça a história de quatro animais que driblam as suas adversidades e mostram a importância de serem reconhecidos e visíveis aos olhos da sociedade:

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© 2020 por Gabrielle Garcia.

São Paulo, SP.

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