
FOTO. Os olhos de Lucio brilham no colo de Suéllen, sua tutora
O resgate de uma vida
O número total impressiona. No Brasil, existem mais de 30 milhões de animais abandonados, entre 10 milhões de gatos e 20 milhões de cachorros, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).
PRINCIPAIS MOTIVOS DE ABANDONO
Ninhadas inesperadas
14%
Mudança de casa
13,7%
Fatores econômicos
13,2%
Perda de interesse
11,2%
Comportamento
11%
Alergia ao pelo
7,7%
Morte do proprietário
3,5%
Fonte: Affinity Petcare
Viver nas ruas é estar em estado de vulnerabilidade, principalmente para acidentes.
Foi o que aconteceu com o Lucio, um cachorrinho de 3 anos.
São Paulo, 7 de dezembro de 2019 – A caminho de seu trabalho, a biomédica Suéllen Cardoso, 30 anos, presenciou o atropelamento de Lucio. O responsável pelo acidente não parou para prestar socorro, deixando o cãozinho no meio da rua sem poder se locomover.
Ele foi atropelado na sua frente. Eram 7h da manhã de um sábado e ela, em tese, não poderia parar. “Trabalho num laboratório de imagem e tinha paciente marcado. Fiquei toda cheirando carniça, mas jamais conseguiria deixá-lo para trás, então o levei comigo para o trabalho.”
Após o término do seu primeiro atendimento, Suéllen saiu em busca de ajuda veterinária. Não foi fácil, porque aconteceu no período do final de ano, mas logo encontrou um local que o tratou adequadamente. “Depois de ter feito o raio x, ele foi encaminhado para a cirurgia. Quando abriram, viram que estava pior do que o raio x tinha mostrado”, conta.

Lucio teve fratura total da coluna e acabou ficando paraplégico.
Quantos animais não são atropelados diariamente? Será que todos eles têm a chance de um resgate? Infelizmente, muitos cães e gatos com alguma adversidade são abandonados. Há um senso comum estagnado na sociedade de que se não houver tempo e renda para prestar os cuidados necessários, é motivo de abandono.
A biomédica conta que a primeiro momento a ideia era conseguir um adotante para ele. “Eu tinha acabado de concluir a minha pós-graduação e tinha que fazer estágio, ficar o dia inteiro fora, então, não teria como ficar com ele e nem com quem deixá-lo nesse tempo. Isso para mim era um empecilho.”
O cachorrinho ficou no hotel da clínica veterinária e não foi adotado. “E daí a gente se apega né?”, brinca a tutora, após mencionar a decisão de ficar com o Lucio, que está saudável e sob os seus cuidados, com muito amor.
“O que falta é entender melhor a rotina desses animais, não é esse ‘bicho de sete cabeças’, tudo a gente se adapta. Eles não são o problema, é a nossa cabeça, porque para eles a deficiência não é impedimento algum para nada, agem como qualquer outro cachorrinho”, diz Suéllen.
Cuidados e tratamentos
Existem vários tratamentos veterinários que prolongam a qualidade de vida dos pets, principalmente os que apresentam alguma doença ou deficiência. O Lucio sente muita dor muscular, pelo esforço que exerce nas patinhas da frente, e para esse controle realiza sessões de fisioterapia duas vezes na semana. “Ele faz exercícios musculares, que é para fortalecer a musculatura. E, com a fisioterapia, estamos tentando chegar no andar medular, que é um andar inconsciente, por estarmos sempre estimulando. Eu sinto muita diferença, tenho vários vídeos dele dando coice com a pata, a fisioterapia é essencial”, relata a tutora.
Além deste tratamento em específico, o cão faz o uso de uma técnica chamada moxa, uma espécie de acupuntura sem agulhas. Foi a única solução encontrada por Suéllen para tratar os incômodos que Lucio sentia. “Ele sempre chora de dor quando o pega no colo. Quando foi atropelado, em dezembro, ficou com um machucado na patinha que só conseguimos sarar agora [após 9 meses]. O que adiantou foi a moxa, em uma semana”, explica.
Embora exijam uma atenção especial, diferentemente dos cães em condições “normais”, a experiência é recompensadora. O único segredo está na paciência, no carinho e na dedicação. “A minha rotina está quase como se eu tivesse tido um filho, e é uma satisfação maravilhosa, ele é um grude comigo.”
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LEVE O LUCIO PARA PASSEAR
Cuidar é um ato de amor
Técnicas e métodos profissionais são capazes de apresentar soluções até mesmo aos animais inicialmente considerados inaptos a reagir positivamente a qualquer tratamento
A reabilitação animal é, muitas vezes, vista como um mecanismo necessário apenas em casos de recuperação de lesões, porém ela traz muitos outros benefícios que proporcionam maior qualidade de vida aos pets.
O que muitas pessoas confundem é associar a reabilitação com a fisioterapia, sendo que esta modalidade é utilizada apenas para tratamentos ortopédicos. Além dos métodos de reabilitação serem eficazes na recuperação de animais com traumas e fraturas, também auxilia no combate a enfermidades neurológicas e físicas, como a diminuição de dores, a obesidade, a melhora da postura e locomoção.
De acordo com a médica veterinária, Camila Rugeri, o não voltar a andar em animais paraplégicos é relativo. Os tratamentos de fisioterapia possuem grandes resultados para que esses pacientes voltem a ter movimentos.
Afinal, como de fato um animal totalmente paralisado pode recuperar sua mobilidade?
A profissional explica a possibilidade dessa recuperação com o chamado andar medular – que é o caso do Lucio –. “Quando o paciente tem um grau de lesão mais grave na medula, perdendo totalmente a movimentação e a sensibilidade, a chance de ele voltar a andar conscientemente é muito baixa, não que não exista, mas é bem baixa. Então, desenvolvemos esse andar medular, que por alguns exercícios estimulantes esse paciente consegue fazer a movimentação dos membros sem estar consciente desse andar. Não é um andar perfeito como se não tivesse nada, é um pouco sem coordenação, porque é totalmente dependente de reflexos.”
Hoje temos uma gama bem grande de tratamentos para diversas doenças e deficiências, cada qual com o seu objetivo. Camila conta que as terapias escolhidas são de acordo com a necessidade do animal, visando o que ele precisa para ter uma qualidade de vida.
E para que todos estes tratamentos tenham a sua devida eficácia, a responsabilidade também está nas mãos dos tutores, é importante realizar exercícios estimulantes ou de alívio de dor em casa, conforme orientação médica veterinária. São apenas três ingredientes: paciência, atenção e carinho.